Dias ensolarados são considerados um vantagem competitiva no Brasil. Como pontuou Heriberto Araújo no artigo escrito ao jornal The Guardian, antes da copa do mundo de 2014 o Ministério do turismo criou um website onde turistas poderiam comparar o número de dias ensolarados de capitais nos EUA e Europa ao de cidades brasileiras.
Enquanto turistas usam a luz do Sol para se bronzear em nossas praias movimentando a economia do país, o setor de energia solar fotovoltaica ainda anda tímido por aqui.
De acordo com as estatísticas da Agência Nacional de Energia Elétrica, ANEEL, a energia solar representa apenas 0,1% da matriz energética brasileira. Já a geração de energia através de hidrelétricas representa 70% do total.
O Potencial da Energia Solar no Brasil
Quinta maior economia do planeta, o potencial do Brasil é enorme. O país apresenta índices de radiação solar diária entre 3.500 e 6.250 Wh/m2, duas vezes maior que a Alemanha, país com maior penetração de energia solar na matriz energética.
Em comparação com outros países latino americanos como México, Chile e Argentina, o Brasil oferece vantagens decisivas, são elas:
- Mercado bem regulado com definição clara da estrutura das agências federais e organizações;
- Clara intenção política em diversificar a matriz elétrica aumentando a participação de fontes renováveis;
- Isenção tributária, como do ICMS (na maioria dos estados), do PIS e Cofins sobre a energia gerada;
- Alto preço da tarifa elétrica;
- Crescimento dos investimentos em energia solar.
Segundo o último relatório da Empresa de Pesquisa Energética, EPE, a estimativa é que até 2026 a capacidade instalada em energia solar atinja 12 GW. Hoje o país conta com apenas 0,28 GW instalados. Para chegar a esse patamar, muito investimento será necessário, só o BNDES espera investir U$2,5 bilhões no setor em 2018. Com a regulação de geração distribuída vigente, os investimentos podem chegar a U$25 bilhões até 2030.
A geração distribuída, caracterizada por sistemas fotovoltaicos de até 5 MW de potência, é o principal fator de crescimento do setor no Brasil. A Resolução Normativa (REN) nº 482, que instituiu o modelo de net-metering no país, reduziu as barreiras na incorporação da geração distribuída que só em 2016 aumentou em quatro vezes o número de instalações, terminando o ano com 81 MW instalados, distribuídos em 7,7 mil unidades (dados da ANEEL). Segundo estimativas da EPE, até 2026 serão 770 mil unidades de geração fotovoltaica sob o regime da REN 482, totalizando 3,3 GW, o que representará 0,6% do consumo total no país.
Através da atualização da REN 482 em março de 2016, o consumidor recebeu ainda mais incentivos para aderir à geração distribuída e produzir sua própria energia de fonte limpa e barata. Pessoas podem formar cooperativas e instalar sistemas otovoltaicos conectados à rede e ter sua conta de luz compensada todo mês pela energia gerada na sua cota da planta solar. Os alto custos da tarifa elétrica e o caráter sazonal da matriz energética brasileira não deixa o consumidor em situação favorável e cada vez mais brasileiros se dão conta disso.
Benefícios da energia solar para a economia
Além de ser uma alternativa sustentável e reduzir as emissões de carbono da matriz energética do país, a energia solar tem outros benefícios para a economia. Devido a característica “on-site” de muitos empregos ligados à energia renovável, o setor gera desenvolvimento econômico de comunidades antes sem oportunidades. De acordo com o relatório da Environmental Defense Fund (EDF), os empregos ligados a energia renovável representam grande e crescente parte da força de trabalho americana. São 209.000 empregos no setor de energia fotovoltaica nos EUA com crescimento 12x maior que a criação de empregos nos outros setores. Estimativas apontam 2.8 milhões empregos no setor de energia fotovoltaica no mundo. Já no Brasil, atualmente são estimados 4.000 empregos no setor de energia fotovoltaica. Por quê não podemos atingir o mesmo nível de geração de empregos dos EUA no Brasil? Algo de suma importância em épocas de recessão econômica. Pesquisas mostram que investimentos em energia renovável e eficiência energética fomentam o desenvolvimento econômico com a criação de mais empregos por real investido e gerando oportunidades de emprego com melhores salários, melhorando a qualidade de vida e estimulando as economias locais.
Entraves para a Energia Solar no Brasil
Agora que analisamos o potencial do país, vale pontuar as nossas limitações. Os principais entraves são a insegurança política, que causa um desconforto regulatório, o baixo número de leilões de energia de reserva para a energia solar no Brasil, o plano do governo de requerer equipamentos de conteúdo nacional, geralmente mais caros e menos competitivos que os fabricados na China e a falta de linhas de créditos voltadas para o setor.
Cancelamento de leilões para a energia solar no Brasil
Grandes multinacionais do setor iniciaram operações no país mirando os leilões do Ministério de Minas e Energia (MME) para contratar energia nova. Contudo, para os leilões que ocorrerão ao final de 2017, a energia solar poderá participar apenas do primeiro, chamado de A-4, para projetos que irão entrar em operação daqui a quatro anos.
No final do ano passado, o ministério cancelou um leilão de energia de reserva e passou a considerar a opção de descontratar projetos de energia já em andamento. O argumento utilizado na época foi de que a crise econômica reduziu a demanda por energia e, portanto, não haveria necessidade de novos projetos de parques solares. Especialistas do setor dizem que a descontratação foi devido à dificuldade de algumas empresas vencedoras em cumprirem o contrato. A alegação é de que a exigência de conteúdo nacional para receber financiamento do BNDES, em um mercado com escassos fabricantes nacionais, e o aumento dos custos com importação devido à desvalorização do real frente ao dólar após o leilão, inviabilizaram os projetos. Apenas 19 das 111 plantas fotovoltaicas iniciaram a construção e de acordo com a ANEEL, 24 das plantas encontraram dificuldades relacionadas à viabilidade econômica dos projetos. No leilão de 2014 o mercado surpreendeu com preço médio de R$ 215,12/MWh para a energia solar – um deságio de 17,9% em relação ao preço-teto de R$ 262/MWh estabelecido pelo MME.
Plano do governo para incentivar equipamentos de conteúdo nacional
Fabricantes em todo o mundo estão de olho no potencial da energia solar no Brasil, país de dimensões continentais, com 200 milhões de consumidores e muito Sol. Contudo, o plano do governo de requerer um mínimo conteúdo nacional nos equipamentos é uma barreira a entrada de módulos fotovoltaicos, que já são considerados commodities. Algumas fabricantes que se instalaram no país já estão sofrendo com os altos impostos e custos de produção, o que faz com que os módulos nacionais sejam 40% mais caros que os importados da China.
Falta de financiamento para energia solar no Brasil
O país ainda conta com poucas linhas de crédito voltadas para sistemas fotovoltaicos. O BNDES é a maior fonte de financiamento e exige o mínimo de conteúdo nacional para os equipamentos. A melhor linha de crédito até então é oferecida pelo Banco do Nordeste (BNB) através do FNE Sol, repasse do próprio BNDES e só oferecida na região da Sudene, onde o BNB atua. O histórico de altas taxas de juros faz com que empréstimos em bancos comerciais para grandes projetos no setor energético sejam proibitivos. Além disso, os agentes financiadores estrangeiros estão cautelosos devido aos escândalos políticos e a recessão da economia brasileira.
Independência ou Morte?
Com o crescimento da geração distribuída através da energia solar no Brasil, muitas pessoas estão aderindo ao movimento de emancipação das concessionárias locais e produzindo sua própria energia. Para se atingir índices que indiquem uma consolidação do setor solar, muitas ações ainda são esperadas do governo brasileiro para que as condições favoráveis sejam criadas, perdurem e assim, o setor possa andar com as próprias pernas. O fato é que a energia solar já demonstrou sua força em outros países e foi capaz de gerar empregos e crescimento econômico. Então, joguem suas fichas! Energia solar no Brasil: Independência ou morte?